segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Desacontecências de 2015



Sabe aquela besteira de fazer retrospectiva de fim de ano? Pois. Resolvi refletir sobre o que não aconteceu. Puxando do volume morto das deslembranças, mostrarei para meus compadres velhos como gastei, ou deixe de consumir esse pedaço do Bilhete Único que é a vida bela e terceirizada, em sua parte 2015. Aliás, haverei de apenas comentar como experimentei os choques das coisas que não aconteceram, e por não terem se efetuado, emprestaram grande significação para este vivente insignificante.

Mirando nas minhas desacontecências, é de citar primeiramente a mais importante: não chegou a Grande Hora, a viagem causadora de tantos surtos psíquicos nos que não sabem esperar pela grande viagem. Não foi o ano do epílogo desta grande personagem da comédia humana. Pegando o fio dessa meada, também não foi o ano em que meti a faca no bucho de algum perverso irmão das almas safado ou não abri processo contra aquela vaca vigarista que me ludibriou. “A vida de um ser humano, entre outros seres humanos, é impossível. O que vemos é apenas milagre; salvo melhor raciocínio”, ponderou o grande João Guimarães Rosa. Portanto, foi o ano em que sobrevivi dividindo o planeta com patifes e canalhas de toda espécie, sem radicalizar.

Não dei à luz meu livrinho de poesias, o “Laranja Romã”, considerado por mim mesmo e por meu crítico leitor Ameba como a melhor safra da minha bibliografia trovadora. Culpa do editor, um sujeito avaro e desconfiado que só trabalha com money à vista.

Não li o romance “Fup”, do escritor americano Jom Dodge, lançado em 1983. “Fup é um  daqueles livros que, no lugar de leitores, conquista devotos”, disse Marçal Aquino, prefaciando a obra. Sou devoto de “Cem anos de solidão”, Gabriel Garcia Marquez, e queria dedicar meu afeto espiritual a “Fup”, mas não deu em 2015. Aceito como presente de fim de ano. Em compensação, li uns 30 livros em 2015 que me deram muitas ideias das nossas imensas possibilidades enquanto seres pensantes e mutantes.

Afinal, não aconteceram tantas coisas iniquas, impróprias, indecentes e improcedentes que 2015 fica sendo o ano em que escapamos ilesos, aqui acolá com os senões costumeiros que fazem parte do jogo do rato, esse maldito esquema que temos que jogar o tempo todo.

“Feliz é o homem sem notícias”, dizia o antigo poeta. Este ano de 2015 foi um ano tão sem manchetes no meu diário que até agradeço por passar despercebido.  Joaquim Ferreira dos Santos é colunista do jornal O Globo, do Rio. Ele escreveu e eu assino embaixo: “Para 2016, eu sugiro a felicidade pelo avesso. No auge da revolução dos jovens, nos anos 1960, Nelson Rodrigues sugeriu: “Envelheçam!”. Hoje, na revolução do estresse, eu atualizo o verbo: “Desaconteçam!”

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