segunda-feira, 25 de maio de 2015

A rua de minha vó



Itabaiana do Norte. No bairro pobre da Suburbana fica a Rua Joana Cândida da Costa, minha avó paterna. Por que uma mulher simples do povo acabou dando nome de rua em Itabaiana? Para tudo nessa vida há uma explicação. Deu-se que meu pai era secretário geral da prefeitura e quis homenagear sua mãe. Aproveitou o prestígio do prefeito com os vereadores e pronto!
Alertando aos moradores da velha Itabaiana, que amanhã faz 124 anos de emancipação política: minha avó Joaninha da Pólvora não era uma qualquer. Trata-se da mulher do seu Benedito ferroviário, mãe do jornalista Arnaud Costa e avó do velho Leão, um sessentão que não tem nenhum compromisso com a isenção nem a modéstia. Dito isto, explico porque minha avó Joaninha adquiriu o direito de dar nome a uma rua, mesmo que seja uma dessas passagens tipo arraia-miúda, um quase bequinho, um atalho de pobre.
Dona Joaninha, além dos predicados de ótima cozinheira e excelente mãe, avó boníssima e vizinha legal, conhecida em toda ribeira na rua das Flores e adjacências por gato e cachorro, era uma mulher corajosa e destemida. Na época em que a linha do trem estava se estabelecendo na região, a Great West dinamitava os cortes de serra para nivelar a via permanente por onde passariam os trens. Como empregado da empresa, seu Benedito guardava os explosivos em casa. Dona Joaninha, sua esposa, passava o dia fumando seu cachimbinho e tomando conta do arsenal. Tudo por amor ao progresso. Por sua conta, sem temer o perigo, abrigava toneladas de dinamite que mudariam profundamente a face daquela terrinha, através da ferrovia. Ficou conhecida como dona Joaninha da Pólvora até morrer, ironicamente vítima de um incêndio em sua casinha. Mas não foi o explosivo ferroviário. O cachimbinho caiu na rede e provocou a queimação. Já não existiam serrotes para serem dinamitados pelos petardos ingleses.
Na verdade, minha terra precisa restabelecer as pontes com sua memória. Ontem, foi lançada a 3ª edição do livro “Itabaiana, Sua História – Suas Memórias, 1500 – 1976” do escritor Sabiniano Maia. É um bom indício. Precisamos ocupar os espaços vazios em favor da exaltação dos bons exemplos do passado, para fazer o contraponto com as mediocridades do presente e superar o momento/acidente vivido agora. A boa notícia é que um grupo de jovens professores está tentando fazer levantamento técnico dos prédios históricos da cidade para fins de tombamento. Sabem que é difícil, mas percebem que todo esforço deve ser feito para que mais e mais itabaianenses venham a reconhecer o valor da preservação de nossa memória e se disponham a colaborar.
Eu arrisco confessar para vocês uma ideia que tive agora: fazer um estudo sobre todas as ruas da cidade, começando com a rua de minha avó Joaninha da Pólvora, claro! Uma luta a mais para a gente atravessar as pontes dinamitadas pelos carreiristas, ambiciosos e corruptos que transformam nossa cidade num simples roçado ou fazenda de boi mineiro, para apenas usufruir de nossas forças e riqueza.
Em tempo: na minha imodéstia opinião, já deveriam tratar de dar meu nome para uma rua qualquer. Cidadão honorário já sou, com justo orgulho. 


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