domingo, 8 de dezembro de 2013

O estranho mundo dos outros


Conforme a filosofia de botequim, cada cabeça é um mundo. Eu pouco me conheço, mas você, quem é? Não sabe. Não sei. Andando por aí, a gente esbarra na vida dos outros e acha tão estranha! E vice-versa.

Camaradinha canta loas às terras percorridas nos estrangeiros, gosta de Orlando na Flórida, adora Walter Disney, chama de merda a cidadezinha do interior da Paraíba onde provavelmente nasceu. A miséria e a grandeza dessas pessoinhas, mundos indelicados, colonizados, brutais em sua rude visão de mundo.

Essa mulher é um mundo, disse Vinicius de Moraes em um soneto sobre a miséria e a grandeza de quem ama. A outra, a da “dissolução dos costumes”, bebe aguardente na birosca com sua amásia, conforme vi num documentário imenso de humanidade, acho que de Egiberto Coutinho, sobre moradores de um prédio no Rio de Janeiro. Que costumes?  

Fiel à lei do cão, torcedor agride rival com tacape. Multidão de jovens praticando luta livre no campo de futebol, batalha coletiva que transforma malquerença de torcida em barbárie. A televisão que exalta as lutas de MMA, a indústria cultural que propagandeia a violência é a mesma que lamenta as cenas de porrada nos campos. Joelhadas, cacetadas, golpes violentos no rosto, pontapés em pessoas caídas, tudo saído da lógica mercantilista escrota das TVs pagas e abertas. De que mundo sai esse povo?

Jovem pára o Fiat Uno na porta de minha casa e bota o funk na altura máxima do potente som. O outro, o vizinho de vinte anos, vive imerso no mundo dele feito de silêncio e solidão. Um pária, um apátrida na pátria do imbecil do funk.

Um sonho que não acabou. Ele canta todo dia a velha canção composta em 1955 para ser gravada por Marisa Gata Mansa. Cintilando no olhar, a mesma esperança de fazer sucesso no rádio de meio século atrás. Como um fantasma derrotado, o velho gravador de fita permanece mudo. Nunca mais repercutiu a modinha. Mas os vizinhos sabem de cor, de tanto ouvirem na sua voz rouca de barítono. A esperança é uma tendência global.

À noite, meus medos crescem. Os pavores tomam forma, ganham consistência. O fim do mundo será à noite. Pelo menos do meu mundo.


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